6.1.21

MMA – UFC NO TOPO DO MERCADO MUNDIAL

 


* MATÉRIA ATÉ DI  6 / JANEIRO / 2021 * QUARTA-FEIRA * DIA DE REIS *

MMA – UFC NO TOPO 

DO MERCADO MUNDIAL

UFC SÓ CRESCE E CONCORRENTES FICAM ESTAGNADOS

 

- Com a chegada de uma nova década, o Combate.com olha para trás e analisa algumas das grandes mudanças que o MMA sofreu nos anos 2010. Para começar, uma crônica de como o UFC se distanciou de seus concorrentes e se tornou uma potência global dominante no esporte.

- Após uma década em que ressurgiu das cinzas e se tornou o principal evento de MMA do mundo, o UFC entrou nos anos 2010 com apenas um desafiante restando para limpar a concorrência. O Strikeforce, evento californiano que começava a incomodar ao contratar lendas como Fedor Emelianenko e Alistair Overeem, era a única organização que sobrava após a Zuffa LLC, empresa mãe do Ultimate, comprar e absorver o Pride, o WEC e a WFA.

- Essa concorrência não durou muito tempo. Em março de 2011, Dana White anunciou que a Zuffa havia comprado o Strikeforce, que estava perdendo dinheiro em sua tentativa de competir com o UFC. O chefão prometeu que manteria o evento vivo separadamente, mas seus principais astros, à exceção de Fedor, foram rapidamente sendo absorvidos pelo Ultimate, e o Strikeforce fechou suas portas de vez em 2013.

- A partir daí, o caminho estava aberto para que o Ultimate praticamente monopolizasse o mercado do MMA. Nenhum outro evento tinha capacidade de competir com as bolsas pagas pela Zuffa.

- O UFC foi muito sagaz em perceber que, se não fizesse alguma coisa, começaria a dividir o mercado com outros eventos. Era uma época boa para a gente como manager, porque tinha a oportunidade de oferecer seu lutador a outros eventos com bolsas iguais ou até melhores que o Ultimate. Em outras indústrias, acho que esta prática não teria sido permitida, mas o MMA era um esporte novo, os legisladores não tinham ainda domínio do assunto e foram deixando até que o UFC virou um monopólio, que perdura até hoje - diz Alex Davis, experiente manager de lutadores com mais de uma década de atuação no mercado.

- Mas só isso não explica por que o UFC se distanciou tanto das demais organizações de luta. Outro fator decisivo foi o acordo fechado entre a organização e a Fox, uma das quatro principais emissoras de TV aberta nos EUA, em outubro de 2011. Outras promoções, como o EliteXC e o Strikeforce, já haviam tido eventos isolados transmitidos em canal aberto, mas a diferença agora era que o Ultimate garantia quatro cards anuais ao vivo na TV aberta por sete anos, além de transmissão e espaço nobre nos vários canais a cabo e plataformas digitais da empresa.

- Eu acho que a maior diferença que ajudou eles foi o contrato de televisão que eles fecharam com a Fox, que fez uma grande diferença. Trouxe o MMA para o mainstream, estava na Fox, nos canais abertos. Isso fez uma grande diferença para o esporte e ajudou a separar o Ultimate dos outros concorrentes deles - afirma Ed Soares, manager de lutadores como Anderson Silva, Lyoto Machida e Rodrigo Minotauro e um dos donos do evento americano Legacy Fighting Alliance.

- A ambição do UFC não parou por aí. Insatisfeita em ser apenas a líder do mercado de MMA, a companhia queria ser equiparada às grandes ligas esportivas dos EUA, como a NFL, MLB e NBA. Para tanto, tomou duas medidas que geraram polêmica. A primeira foi um contrato de exclusividade para fornecimento de material esportivo com uma gigante do mercado, a Reebok, em 2014. Esse tipo de acordo é praxe nessas grandes ligas, mas veio atrelado a uma polêmica no UFC: a proibição da exibição de patrocinadores pessoais em uniformes e banners.

- Acho que foi um tiro que saiu pela culatra. Esse negócio não foi bom pra ninguém, nem pro Ultimate, nem pros lutadores, nem pra Reebok. Teve vários efeitos: diminuiu a receita dos lutadores brutalmente; se assassinou toda uma indústria, um ecossistema de empresas ao redor do esporte, que estava crescendo - a Hayabusa, Affliction, Tapout - que eram muito importantes para a indústria. Para a Reebok, não gerou tanto interesse pela empresa. A Reebok não fez nenhum esforço para fazer as roupas melhores - analisa Alex Davis.

- Apesar dos muitos protestos e críticas, a padronização dos uniformes limpou a imagem das lutas e logo foi copiada por outras organizações, como o Absolute Championship Akhmat (ACA) e a Professional Fighters League (PFL). O cuidado com produção e apresentação do Ultimate sempre o diferenciou de seus concorrentes, e sua posição como líder da indústria o tornou modelo.

- Eu tenho uma teoria que sim, de certa forma ela limpou o esporte, tirou aquela poluição visual, mas ela também criou uma impressão "orwelliana" do esporte, ela tirou a excitação gráfica. Para mim, aquilo não foi bem sucedido - acrescenta Davis.

- A segunda grande medida adotada pelo UFC foi o acerto para que a Agência Antidoping dos EUA (USADA, na sigla em inglês), entidade responsável pelo controle de substâncias proibidas do Comitê Olímpico Americano, fizesse também este trabalho com os lutadores do evento. O Ultimate foi pressionado a tomar essa atitude após uma série de resultados positivos para doping de alguns de seus principais nomes, como Anderson Silva, Jon Jones e Vitor Belfort, e, em 2015, deu autoridade total para que a USADA fizesse exames independentes e sem sobreaviso por todo o ano em seu elenco.

- Acho que foi bom para tentar limpar o esporte, mas acho que foi uma das grandes razões que eles usaram para mostrar que o esporte está crescendo, adotando o mesmo sistema de testes das Olimpíadas. Isso valorizou muito, os caras viram que eles estão botando os sistemas no lugar - argumenta Ed Soares.

- A credibilidade renovada com a regulação séria do uso de doping, somada ao carisma de astros como Conor McGregor e Ronda Rousey (revelada pelo Strikeforce, por sinal), ajudaram a levar a cobertura do UFC à grande mídia nos EUA e no resto do mundo. A liga se tornou um grande negócio, o que se refletiu na sua venda em 2016 para o grupo William Morris Endeavor (WME), uma das maiores agências de mídia do mundo, por estimados US$ 4 bilhões, maior aquisição da história da indústria esportiva.

INEXPERIÊNCIA E INCOMPETÊNCIA ENTRE ASPIRANTES À CONCORRÊNCIA

- O resto do mundo não simplesmente desistiu e deixou o UFC engolir o mercado inteiro. Na última década, proliferaram eventos pelos quatro cantos do planeta; hoje, não há um fim de semana sem múltiplos torneios de MMA em algum lugar. Mas nenhum deles até agora chegou ao nível de competir com o Ultimate pelo público e pelos principais atletas.

- Parte disso é simplesmente uma questão de tempo: com a terra arrasada deixada com a compra dos principais adversários, poucos dos aspirantes restantes tinham mais de dois anos de vida em 2011. Faltava tempo e experiência para que eles se estabelecessem. Outro lado é uma falta de desejo em competir: a ampla maioria dos torneios está contente em formar talentos para o UFC.

- Posso falar por mim: o LFA não é um evento que quer ser concorrente do Ultimate. A gente gosta de criar o talento. A gente cria o talento que pode ir pro Bellator, pro Ultimate, a gente apóia. Hoje em dia, a gente é o maior evento do mundo em criar talento, e era isso que a gente queria fazer. Não quero ser o UFC nem o Bellator - conta Ed Soares.

- Outro problema, na visão dos empresários, é incompetência e falta de comprometimento dos promotores. Muitos eventos surgiram, prometeram e não cumpriram acordos com lutadores e investidores. Outros ainda lutam para competir, mas são vistos com desconfiança. A PFL, por exemplo, reuniu um time forte de investimento e vem para 2021 com um dos melhores elencos fora do UFC, incluindo Fabricio Werdum, Anthony Pettis e as bicampeãs olímpicas Kayla Harrison e Claressa Shields, mas sua ligação com o extinto World Series of Fighting é mal vista.

- A gente já viu muitos desses eventos tentarem funcionar, mas a maioria deles não entende o business. Onde está o World Series of Fighting hoje? Não está mais lá. Quando foi o último evento do Bamma? PFL não fez um evento em quase um ano! Acho que essas pessoas crescem o olho, acham que vai ser fácil, mas quando eles começam a mexer, cai a ficha que não é tão fácil - pensa Soares.

- Quem mais se aproximou do UFC nos anos 2010 foi o Bellator. Fundada em 2008, a companhia californiana foi comprada pela gigante das telecomunicações Viacom no final de 2011, e trouxe Scott Coker, fundador e cabeça por trás do Strikeforce, em junho de 2014 para assumir a presidência. Apesar disso, a organização ainda não conseguiu rivalizar com o Ultimate em audiência ou cobertura midiática.

- Eu acho que o Bellator tinha as contas pagas e não tinha pressão empresarial para realizar números maiores. O Ultimate sempre buscou aumentar os números. O Bellator se contentava com sua parcela de mercado, se contentava em manter o público que tinha com o talento que o UFC estava descartando, sem fazer um esforço para produzir seu próprio talento e fazer um produto paralelo ao UFC. Não teve muito esforço de imagem e criatividade. Sempre escutei deles que já atendem o mercado deles, sabem o que eles querem - comenta Davis.

PROJEÇÕES PARA A PRÓXIMA DÉCADA

- Conforme entramos nos anos 2020, é difícil visualizar o UFC perdendo espaço no mercado. Em 2018, ao final do acordo com a Fox, o UFC fechou contrato de cinco anos com a Espn, maior canal a cabo esportivo nos EUA e parte da Walt Disney Company. A empresa também tem um dos quatro maiores canais de TV aberta do país, a ABC, que deve exibir seu primeiro evento ao vivo do UFC em 16 de janeiro.

- Os concorrentes, contudo, estão melhores equipados. O Bellator mudou sua direção para focar mais em cultivar seus próprios astros, melhorou o nível de sua produção e contratou alguns grandes nomes que deixaram o UFC no ano passado: Yoel Romero, Anthony Johnson, Corey Anderson. - A PFL aposta em seu formato original de GP, no seu elenco reforçado e na exibição nos canais Espn. O ONE Championship investe para conquistar o continente asiático enquanto, aos poucos, busca inserção no mercado americano através de uma parceria com a Turner Sports.

- Um fator pode mudar esse equilíbrio de poder: uma ação civil movida desde 2014 por ex-lutadores do UFC, que acusa a Zuffa LLC de formar ilegalmente um monopólio do mercado de lutas. Em dezembro passado, o processo foi reconhecido como uma ação de classe. Se os lutadores vencerem, poderão reivindicar uma parcela da receita do Ultimate na última década. Paralelamente, grupos de lutadores mobilizam políticos para votar a favor de emendas no Ato Muhammad Ali de Reforma do Boxe, que regulamenta as práticas promocionais no boxe nos EUA, para que ele também valha no MMA.

- O UFC vem combatendo tanto a ação quanto a proposta de lei, que podem alterar significantemente como a companhia contrata e promove seus lutadores. As consequências não são necessariamente positivas para os atletas.

- Essa é uma ação na Justiça civil que pode durar anos e anos, e na Justiça americana quem ganha uma ação é geralmente quem tem mais dinheiro para tocar a ação. O Ultimate é muito bem defendido, são muito inteligentes, e ninguém sabe realmente o que vai acontecer com o Ultimate e quais serão os efeitos para o atleta. Infelizmente, o atleta tem o menor benefício por participação que todos os participantes desse cenário econômico - finaliza Davis.

Fonte: combate.com